30 de setembro de 2021
Há exatos seis meses a minha vida mudou completamente.
Estou aqui pensando, nesta tarde de primavera de vento fresco, se eu
conseguiria prever algo assim na minha vida... e a resposta é: não!
E nem falo isso pensando que foram os meus pais que morreram em um
intervalo de seis meses. Não.
Falo em como a vida é o instante em que vivemos.
Só isso.
Este instante, agora, em que constantemente tomamos decisões. Porque
precisamos tomar essas decisões. Porque precisamos constantemente estar em uma
rota, com algum destino. Precisamos cumprir uma meta, seguir uma rotina. Este
instante.
Quem nunca viu num filme a velha pergunta “se você soubesse que isso aconteceria, o que teria feito de diferente?”.
**
Eu estou me sentindo só. Mas esse é outro cenário que não foi gerado ou
agravado pela morte de meus pais. A pergunta correta que eu devo me fazer é:
quando eu, verdadeiramente, estive com alguém?
Eu vejo o meu cenário pessoal inserido no contexto do cenário coletivo e não consigo dissociar as coisas, não tem como. A pandemia mundial escancarou uma moléstia que atinge a humanidade desde que temos recordação: nossa total falta de empatia com o outro e o nosso egoísmo. Por escancarar assim, tem trazido, também, a urgência de sermos diferentes; de não apenas sermos para mostrarmos, mas de sermos por assim termos nos tornado.
Mas ainda é o começo.
E a minha solidão se reflete principalmente pela falta de conexão que
sinto com as pessoas ao meu redor. Todos estão vivendo seus infernos pessoais
(porque, afinal, o inferno não está no submundo, está bem aqui, no seu
cotidiano) e todos estão vivendo seus dilemas, seus desafios, seus
aprendizados. Isso me faz questionar por que não nos unimos ao invés de nos
afastarmos?
Ah...
Isso me traz à tona uma antiga lembrança de 1996, quando eu tinha 19 anos
e fui lá pro Japão trabalhar. Era uma época de comunicação à base de cartas
enviadas pelos Correios e de fichas telefônicas para usarmos nos orelhões
públicos. Estar distante de alguém fisicamente era realmente estar distante. Eu
me lembro do primeiro grande (e doloroso) aprendizado que vivi lá: as pessoas
com quem convivi não se uniam para se ajudar, afinal, o sintoma comum era a
saudade dos que tinha ficado no Brasil. As pessoas, lá, preferiam pisar umas
nas outras com qualquer tipo de superioridade que fosse (por saber o idioma
local, por ser o mais velho no emprego, por ter mais experiência). Estender a
mão, oferecer o ombro e uma palavra de auxílio? Poderia até rolar, mas tinha um
preço que, em geral, era ser fofoqueiro e delator.
Lembro que sempre compartilhava essa péssima experiência e todo mundo me dizia que nunca tinha passado por isso. Ou seja, era EU quem tinha de vivenciar essa experiência e aprender com ela (eu e as pessoas desse grupo, obviamente).
**
Então, hoje, este dia com gosto, cheiro e textura especial... me faz
pensar no quanto tudo mudou e no quanto eu mudei. Minha solidão sempre foi uma
característica que eu tentei não ter, mas, até hoje, quantas pessoas quiseram
me conhecer? Eu tenho que pagar alguém para poder ser ouvida? Quantas pessoas
estão dispostas a conhecer outras pessoas simplesmente porque, apesar de tudo,
nossas relações humanas são tudo que importa nesta vida, mais nada. Quem?
Sem as relações humanas não temos dinheiro, não temos sociedade, não temos família, não temos com quem nos comparar, não temos ódio nem amor. Se o ser humano não se relacionar entre si, coletivamente, não há nada.
Já aprendemos muito... e ainda temos tanto a aprender.
O que sinto agora, certamente não gostaria de estar sentindo... mas quão
diferente esta solidão poderia ser, senão essa que estou vivendo?