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A morte (carta XIII) e Plutão: a decisão não mais adiada

Há pouco tempo me dei (finalmente) um baralho do Tarô. E escolhi o Waite-Smith pelo estilo clássico e por ser indicado para estudantes que estão aprendendo a ler os símbolos das lâminas. Quase vinte anos estudando o assunto, demorou para isso acontecer. E não é sempre assim?

Ao contrário do que a maioria das pessoas faz, não faço muitas autotiragens. Mas, ontem, me senti impelida a fazer uma pergunta simples, três cartas (passado, presente e futuro) apenas com os arcarnos maiores. E a resposta, tão direta quanto simples, foi um tiro no coração. 

Antes de continuar, vou compartilhar: quem me acompanha neste blogue sabe há quantos anos eu falo de Plutão na minha casa 11 astrológica. Falo de tantas e tantas pessoas que saíram voluntariamente, foram extirpadas pelo tempo ou sumiram sem dar tchau. Falo do quanto isso profundamente mexeu comigo e me fez rever muitas coisas — em especial sobre mim mesma. Porque temos certeza absoluta de que quando a debandada insiste em continuar, o problema é seu, você está fazendo algo errado, seu comportamento está nocivo, você está sendo egoísta e rude.

Quem me conhece sabe que sou extremamente transparente, nunca neguei meus defeitos. Quem me conhece também sabe o quanto sempre lutei para melhorar, me tornar uma pessoa melhor, lapidar as pontas que machucam que a minha criação deixou em mim. E todo o processo de lapidação não é feito de forma rápida, nem quando desejamos: é necessário tempo, é necessária a convivência em sociedade para, ao termos o outro como espelho, consigamos ver em nós mesmos o que pode ficar e o que deve ser mudado.

Isso posto, o ciclo de Plutão em Capricórnio (e, naturalmente, na minha casa 11) está prestes a terminar. Estamos à beira da entrada de Plutão em Aquário — que iniciará não somente uma nova era mundial, mas também marcará o fim dessa limpeza que foi feita em minha vida. 

Mesmo no fim, a ação dessa energia ainda é contundente! Justamente por estar nos graus finais (os graus iniciais e finais de um trânsito são os mais potentes, que geram maior impacto), eu continuo vendo pessoas indo embora. Ou pessoas se ausentando de uma forma muito incompreensível. E eu não tinha compreendido a oportunidade única que me estava sendo ofertada...

E eu ainda estava insistindo em estabelecer amizades... e era uma insistência ilusória. Pautada em: consideração (eu honro o que as pessoas fazem por mim), carência (porque sou canceriana com ascendente em peixes e lua em leão) e teimosia (pois é... mesmo um ser mutável como eu pode ser teimoso às vezes). 

Então, ao fazer a tiragem para mim, três cartas saíram: Sol (passado), A Morte (presente), A Temperança (futuro). Não coincidentemente, A Morte e A Temperança são cartas sequenciais dentre os arcanos maiores. Ou seja, para alcançarmos a fase da Temperança, precisamos necessariamente passar pela fase da Morte. O futuro depende do que eu farei com A Morte em mãos. Com a Temperança no futuro, tudo realmente está em minhas mãos.

Quando acionei essa informação, era questão de tempo para eu me dar conta do que tinha de fazer — embora já soubesse há tempos. 

No entanto, o medo nos paralisa, pelos mais diversos motivos. Aí, fui me dar conta da coisa mais simples e tola possível: Plutão (correspondente direto da carta A Morte, coincidência? Nunca!) está há décadas agindo em minha casa 11, em minha vida. Eu sempre me colocando em posição meio que de vítima. Não entendendo seu mecanismo (por mais que eu seja astróloga, olha o medo paralisando aí), buscando razões e motivos para achar uma lógica. Insistindo em ir contra essa poderosa energia, literalmente.

Eu sei que o astrólogo Carlos Harmitt (que não conhece a minha existência) foi crucial para acelerar as ligações mentais que eu precisava fazer para chegar a essa conclusão. Ele com sua linguagem contundente falando sobre Plutão em Aquário, além de reacender a chama da Astróloga em mim que estava meio apagada, também iluminou o que eu estava fazendo com o fim do trânsito de Plutão no meu mapa: apenas rezando para tudo acabar logo, acreditando que apenas com seu fim, as coisas mudariam (doce ignorância, né, Cris?).

Com a energia plutoniana a última coisa que devemos fazer é sermos passivos. Precisamos agir em conjunto. Precisamos nos conectar à sua poderosa força e entender que a limpeza pode doer mas é para a próxima etapa. E mesmo que você não saiba do que se trata, confie nele, porque você estará purificado para recomeçar: quer algo mais incrível do que voltar a pensar em como começar em um terreno transmutado do que não prestava mais em sua vida?

Porém, quando você não está fortalecido, tomar uma decisão desse porte não é nada fácil...

Quem me conhece, sabe dos desafios que estou vivendo desde 2015 que culminaram com o ano passado, um ano tão ruim quanto foi 2019. 2023 começou em baixa mas, ontem, dia 17/04/2023 às 22h20, tomei uma decisão que foi muito adiada. Eu a adiei o máximo que pude. E, assim como todas as piores dores de minha vida, eu escolhi vivê-la. E, agora, conscientemente, escolho não viver mais.

Mas o que aconteceu entre a tiragem de tarô, as palavras de Harmitt, os anos todos vividos? O que aconteceu é que me dei conta de algo estupidamente ridículo: a minha maior reclamação é que estou sozinha (literalmente, sem ninguém: amigos, parentes, família, amor, colegas) e há tempos tentando reatar antigos contatos ou fortalecer os mais recentes. Não há problema em buscar soluções para um problema — o problema está nas escolhas que você faz. E eu estava escolhendo MUITO ERRADO. Porém, devido a todos os fatores que citei, eu estava à beira de: ou enlouquecer ou mudar radicalmente. Muito atrasada, fiz a segunda escolha. Finalmente!

Eu me dei conta de que por tanto medo de ficar sozinha, eu tinha esquecido de reparar que eu já estava sozinha! Absolutamente. Absurdamente. E eu estava correndo atrás de migalhas de alguns tipos de pessoas por quem tinha consideração — me humilhando, rastejando, pedindo, aguardando o "algo a mais" que nunca veio e nunca virá. Por quê? Da parte dessas pessoas, não sei, nunca saberei. Da minha parte, eu esperava reciprocidade. Gentileza. Educação. E quando o ser humano chega ao ponto de não saber mais ser gentil, educado e recíproco, estamos perdendo a nossa humanidade, nos tornando bestas. 

E afirmo sem sombra de dúvida alguma: estamos vivendo a nossa existência compartilhando o planeta Terra com uma horda de bestas. Não são todos, mas são a maioria esmagadora certamente. O que são essas "bestas"? Pessoas perdidas no mais profundo inconsciente, egoístas, agressivas, radicais, extremistas, individualistas. O mais triste é que, além disso tudo, vivem presas na ilusão inconsciente de que todos estão errados menos elas.

O meu cenário era esse: ficar achando que tinha estabelecido conexões com amizades unilaterais por medo de ficar sozinha. Oras, se eu vivo uma relação unilateral já não estou sozinha?

Então, para finalizar este extenso post, é isso leitor: quando Plutão fizer o chamado, aceite. Não relute. Viva. Como o mais brega clichê possível: nade pelos rios de Hades e renasça. A Morte e Plutão estão te dando essa única e última oportunidade!

Next exit (Próxima saída) — o filme

Há tempos venho tentando escolher um filme para ver. Não. Não é fácil me manter sentada em uma cadeira por quase duas horas ininterruptas. Pausa. Levanta. Distrai. Desiste. Esse tem sido o movimento comum para mim.

O que não aconteceu com este filme: NEXT EXIT

E acho que era isso que precisava mesmo. Um filme fora do circuito comum, de todo o clichê comum que Hollywood e o cinema comercial e todas as suas demandas trazem. 

Tava lá eu no meu site favorito de streaming (gratuito. claro, não dou um centavo para ninguém) e achei essa sugestão. Vi o trailer, li a sinopse. Me chamou a atenção. Em especial por ser um road novie, adoro road movies! Adoro a dinâmica intimista, mas sem ser claustrofóbica, de estar em um carro em movimento, saindo de um lugar e indo para outro lugar o filme inteiro.

E, sob esse contexto, se desenvolve a trama em um mundo futurístico onde as pessoas acreditam em espíritos e em vida após a morte. Mas, como nem tudo são flores, é preciso optar pelo suicídio assistido para chegar ao outro lado — sem ter garantias exatas de como é, como será a comunicação (porque nesse futuro, as pessoas podem ver entes queridos mortos).

O filme não se pauta sob a ótica da ficção científica, então, não inventa teorias malucas nem traz visuais com efeitos gráficos de última geração. Trata-se de um filme mais reflexivo, filosófico sobre as questões que atormentam todos os seres humanos ao menos uma vez na vida: vale a pena viver?

A princípio até considerei o perigo de estar diante de um filme que fizesse apologia ao suicídio. Mas, não. O roteiro (escrito e dirigido por Mali Elfman) traz uma leveza absoluta mesmo tratando de temas pesados. A pitada de comédia cria um antagonismo interessante entre as duas personagens principais. E a fotografia, sempre escura, cinza e fria (o filme começa no inverno de Nova York e termina ainda no inverno mas nas praias da Califórnia), sai do escuro para o claro, mas não totalmente, pois não vemos Sol, vemos pouco dele aliás, pois o filme se passa mais à noite, nas penumbras do amanhecer e do anoitecer. Uma escolha deliberada muito bem feita, que reforça ainda mais o ar anímico-onírico do filme.

Ao mesmo tempo, o filme não é moralista (ainda bem que não caiu nesse clichê) nem é julgador. Ali, as escolhas, o resultado das escolhas, as confusões para fazer uma escolha — são todas respeitadas. E isso gera um conforto inconfundível para nós, espectadores, que acompanhamos a decisão irrestrita de duas personagens cansadas da vida e que decidem morrer, porque não conseguem matar a si próprias. Inclusive, durante a viagem, os dois personagens encontram um padre católico ao acaso. E, mesmo esse padre, não tem lições morais a dar.

Se você não quiser spoiler, pare aqui. O filme está passando no Hulu. Não sei qual streaming no Brasil vai passar o filme.

Se você não liga para spoiler, vamos lá!

O filme termina com uma EQM (experiência de quase morte) da personagem principal. E, nessa experiência, constatamos algo simples: precisamos nos autoperdoar. Precisamos perdoar o que aconteceu no passado, deixá-lo para trás. Claro, continuaremos carregando ele, mas como uma lembrança, não um fardo. O agora, o minuto agora, é o que é mais importante em nossa vida.

Confesso que gostei muito filme. Veio realmente de encontro ao momento reflexivo que vivo. E, de maneira geral, também trata de um tema delicado mas que sempre nos rodeou: todos têm o livre arbítrio para decidir sobre a própria vida? Existe vida após a morte?

Claro, não espere altas reflexões filosóficas, científicas ou moralistas porque esse não é o propósito do filme.

O objetivo do filme é te levar, por horas, viajando de carro atravessando o país, para abrir-se a possibilidades impensadas e para uma nova chance. Nem que seja por um minuto apenas.

Pedaço de quebra-cabeça

Este ano começou com tantos sentimentos e em uma velocidade que, por vezes, ora queria que diminuísse, ora queria que aumentasse.

2023 não começou fácil!

O meu primeiro post foi lindo. Uma tentativa de reconexão com algo interior que ainda não sabia bem o que era. 

No entanto, não foi suficiente.

Eu sabia que havia algo mais a supurar. E, sim, o verbo é esse exatamente: SUPURAR.

Eu não faço terapia (deveria?... quem paga pra mim?). Ao longo da minha vida toda, fiz terapia com amigos próximos, pessoas mais experientes, pessoas mais velhas e, talvez, a melhor delas, a terapia ocasionada por eventos inesperados quando você tem de reagir e agir ao mesmo tempo, em uma equilibrada mistura, delicada o suficiente para alcançar o resultado mais próximo do esperado.

E, admito aqui, já tô perdendo a conta desses eventos.

A vida, para mim, parece um eterno ciclo de lidar com o inesperado. Alguns, até meio previsíveis, outros, no entanto, totalmente impossíveis de prever. Algumas experiências eu fiz questão de viver, por mais dor que me causasse. Algumas escolhas eu fiz deliberadamente, apoiada em um idealismo e esperança otimistas demais para alguém canceriana com ascendente em peixes e Netuno lá no Meio do Céu, como eu.

No começo, nas primeiras experiências, você ainda é jovem o suficiente para se recuperar rápido. Ingênuo o suficiente para acreditar que as pessoas são boas e melhoram com o tempo. Otimista o bastante para imaginar que, no futuro, as melhores coisas estão reservadas para você.

Após uns três golpes, meio sangrando, você ainda crê. Porque o único movimento da vida (na minha opinião, até este momento que escrevo este post) é que amanhã será melhor que hoje. E não é, afinal?

Todo mundo, sem exceção creio eu, deseja uma vida calma, tranquila, previsível. Sem alarmes e sem surpresas. Mas, admita, quantos de vocês aí lidariam sabiamente com isso?

Então, após algumas décadas levando golpes (baixos ou não), a sua situação é precária. Você não é mais jovem, está beirando os cinquenta anos de idade, o seu mundo, o seu contexto, a sua realidade não são um cenário de terra desolada mas você sente cansaço.

E, então, um novo golpe, um "teste da vida" chega inesperado para te testar em relação a tudo que, supostamente, você aprendeu.

  • eu vou conseguir dar conta?
  • como devo me sentir depois?
  • por que isso ainda acontece?

No passado, passei por uma das situações, certamente a pior de todas, em minha vida. Apenas amigos íntimos sabem. E eu acho que fui bem, no contexto geral, tanto que me dei um 10. Hoje em dia, no entanto, eu sei que não foi esse dez perfeito. E, talvez, essa soberba (ela, mais uma vez!) -- ou não... -- me impediu de enxergar algo simples que me pegaria no meu ponto mais vulnerável. E eu não percebi.

Seis meses se passaram (ainda bem que comigo o tempo das coisas é rápido!) e apenas em fevereiro deste ano, vivenciando uma situação difícil do dia a dia, mas nada fora do controle, eu percebi que tinha algo de errado.

Ontem, tirei uma foto em uma tentativa de eternizar o momento que vivia. A sensação de ver a última peça que faltava encaixar no quebra-cabeça da minha vida. Ajeitar corpo-mente-alma. Recomeçar. MAIS UMA VEZ. Mais uma vez...

E tiro umas lições preciosas para esta nova etapa.

  • quem quiser ficar ao seu lado, virá até você.
  • quem quiser ficar ao seu lado, te aceitará como você é, sem exceções.
  • quem não quiser ficar ao seu lado, você deverá deixar ir. Sem olhar para trás, sem arrependimentos.
  • quem for gratuitamente agressivo com você, obviamente, além de ser um problema da pessoa com ela mesma, você deverá se aceitar como vulnerável e não um muro de aço impenetrável.
  • quem ainda permanece com você, naturalmente, saberá ser aberto e sincero, sem meios-termos, sem disfarces ou subterfúgios.
  • quem ainda está aí com você é porque realmente te aprecia. Valorize essas pessoas.
  • AS PESSOAS SOMENTE DÃO O QUE PODEM OFERECER. MUITAS PESSOAS NÃO TÊM NADA A OFERECER, ENTÃO NÃO EXIJA DE QUEM NÃO TEM NADA A OFERECER. E isso será claríssimo de notar. 
  • Não pressione quem não tem nada a oferecer, porque essa pessoa sequer tem algo a oferecer para ela mesma.
Apesar de complexo e quase impossível de compreender, eu ainda gosto de lidar com seres humanos. Remendada e cicatrizando, sigo. É da minha natureza mais primordial ser assim, eterna filha de Netuno.

A maior e mais importante pergunta de todas

 Hoje está um dia frio de 18ºC, atípico para a época.

Um domingo de folias mas em meu coração o único repique é o questionamento.

Acho que nunca fiz tantas perguntas. Eu sempre fiz muitas perguntas, sempre tive curiosidade, sempre quis saber o algo além que uma informação traz. Nunca me satisfiz com uma afirmação. Na minha cabeça, certezas nos guiam mas nos delimitam. 

Será que chega um momento na vida em que cansamos de perguntar?

Será que chega um momento na vida em que precisamos parar de procurar?

Será que chega um momento na vida em que nada mais faz sentido?

Quem acompanha este blogue, sabe que sempre faço declarações contundentes. 

Mas, hoje, o dia é de frases curtas, pensamentos cortados, lembranças aleatórias. Um silêncio do lado de fora que não se mistura com a torrente infinita em minha mente e em meu coração.

Talvez, a melhor pergunta que eu deva fazer a mim mesma seja: se você pudesse apertar um botão que determinasse uma outra rota, distinta de tudo que você viveu até agora, você apertaria esse botão? Você aceitaria viver uma vida comum e oposta a tudo que você descobriu e que direcionou para o que você é hoje?

Apertaria?

Não sei.

Acho que enquanto viver, não terei um momento de tranquilidade em que possa afirmar: nada vai me desestabilizar. Tudo está sob controle.

Acho que estou com saudade de viver sedada e cega para a realidade, saudade de viver em uma ilusão.

Porque quando você escolhe trilhar o caminho oposto à ilusão, é preciso coragem para resistir e perdurar.

Sobre o idealismo e sobre o amor

Acho que sempre fui pretensiosa, admito, por acreditar que uma experiência dolorosa é capaz de nos dar nortes poderosos feitos a partir de reflexões profundas e conclusões quase absolutas. O tempo, sábio, sempre nos mostra que somos sempre aprendizes. E é não tenho vergonha em admitir essa breguice — sou uma constante aprendiz, talvez, um pouco mais esperta agora.

Depois de 2019, eu me considerei capacitada a enfrentar qualquer dor que atravessasse meu caminho em qualquer área da minha vida. Bom, para quem não sabe, esse foi o pior ano da minha vida, que eu sempre repito para mim mesma como um lembreete de onde eu não quero mais estar. E, não coincidentemente, não fiz uma única postagem neste blogue nesse ano.

Eu sabia que algumas resoluções precisavam ser feitas... e seguidas. Depois que você perde muita coisa na vida, em especial o que há de mais puro dentro de sua alma, creio que existam dois caminhos simples a serem seguidos: a recuperação (otimista) e a amargura (pessimista). Alguns seguem um caminho ou outro de forma mais extremista, enquanto que acho que a maioria de nós fica ali no meio-fio, escolhendo lados sem definição, flertando com o que mais agrada no momento.

Eu segui o caminho da reconstrução. 

Porque embora já soubesse, ainda não tinha admitido para mim mesma algo: eu sou idealista. Eu sempre fui idealista e parte das minhas dores nasceu de um terreno não cuidado do meu idealismo. Sim, porque não basta ser puramente idealista, é preciso cuidar desse parte crucial de meu caráter. Os riscos de se viver sob o julgo de um idealismo imaturo cobram um preço muito alto. Preço esse... que já paguei inúmeras vezes.

Mas ainda tinha uma característica minha que eu não queria admitir e que precisou de quase dois anos para que eu tivesse coragem para colocá-la em evidência, para cuidar dela, para tratá-la com o devido respeito. Porque, juntamente com o idealismo, ela sempre fez parte de mim e eu simplesmente a tinha enterrado, soterrado debaixo de muitas experiências ruins e muita dor - o que é a atitude mais comum feita pela maioria das pessoas.

Eu sou romântica, eu acredito no amor.

Acredito que o amor é a resposta para tudo. E essa caracteristica está intrinsecamente ligada ao idealismo. Como eu pude separar as duas coisas, que são quase a mesma coisa?

Pois é... separei.

Precisei fazer um exercício de resgate das lembranças mais antigas que sempre tive sobre as formas de amor que eu senti ao longo da minha existência. Começou com uma foto minha e de minha mãe, que eu associava a um sonho constante que sempre tinha sobre uma mulher que amava, mas que não sabia quem era. Eu achava que ela existia, mas não, ela era uma ideia - a minha concepção de amor - que estava ali, inconscientemente, me chamando. Eu tive muitos sonhos recorrentes em um período curto de tempo. Tudo isso no primeiro semestre do ano passado, especialmente.

Quando eu fiz a conexão, parei de sonhar. E nunca mais tive esse sonho que, agora, são recordações anotadas e guardadas no meu diário virtual dos sonhos.

No final do ano passado, eu fiz algo que nunca tinha feito até então (por preconceito, admito, coisa de pessoa formada em Letras — que erro!): comecei a ler uma fanfic. Foi um ato despretensioso mas estimulado principalmente pela autora: ela sempre me passou credibilidade e eu resolvi dar uma chance.

À medida que fui lendo os capítulos sendo escritos, lágrimas e emoções ressurgidos em total polvorosa dentro de mim (a fanfic é uma história de amor improvável, mas ainda assim, uma história de amor) me chamaram à reflexão. Por que estou sentindo tudo isso? De onde vêm esses sentimentos? Eu ainda sou capaz de sentir tudo isso apenas lendo uma "fanfic"?

Então, a ponte que faltava foi feita.

As reflexões que eu já tinha feito com os sonhos recorrentes que tinha se juntaram ao turbilhão de emoções que eu senti lendo a fanfic - e tudo fez sentido!

Precisei de um tempo para processar, afinal, a mente racional tem uma velocidade, a nossa intuição tem outra e nossa alma tem outra. Precisei alinhar todo mundo para um trabalho em conjunto. A primeira coisa que fiz foi me deixar levar por todas as emoções sentidas lendo a fanfic. Me liberei sem amarras. Comecei a reouvir as músicas de amor que eu sempre amei e que tinha parado de ouvir. Ainda estou caçando uns filmes românticos para ver.

Ao mesmo tempo, fiquei pensando no histórico da minha vida amorosa. Em tudo que sempre fui, as coisas que sempre errei, as felicidades e as imensas dores (essas muito mais) que eu sempre vivi. As decepções. As perdas pequenas e contínuas que foram minando a minha crença no amor. Aos poucos, guardadas as devidas proporções, eu estava me tornando naquilo que eu sempre critiquei: uma sapatona de meia-idade amargurada que não acredita mais no amor e não tem nada a oferecer nada além de reclamações e dores.

NÃO! ESSA NÃO SOU EU!

E esse foi o insight mais maravilhoso que eu poderia ter ganhado de presente de mim mesma.

A minha mente racional diz: a sua realidade ao seu redor continua a mesma, nada mudou. E eu respondo, sim, é verdade. Mas ter alcançado esse entendimento de mim mesma me libertou. Estou me sentindo consciente. Como dizem as frases de autoajuda, não posso mudar as coisas ao meu redor então mudo a única coisa que posso mudar: eu mesma.

Para finalizar, o sentimento de reencontrar essa versão mais pura e antiga minha, que eu achava que estivesse morta e destruída, tem me feito tão bem, que eu não quero me apaixonar, não quero flertar, não quero encontrar (em alguém) lá fora o que tem me satisfeito aqui dentro. Não preciso disso agora — o que não quer dizer que eu não vá querer. Mas, agora, o simples e puro agora é este: estou encantada comigo mesma. Essa parte preciosa que sempre foi minha e que eu achei que tinha perdido.

Uma Cris que sempre foi doce e dedicada, que adivinha pensamentos, que faz leituras precisas... que sempre ansiou por um amor que simplesmente exista por existir e que não precise de lutas, batalhas, provas contínuas e dor. — esse é outro tipo de amor. Eu anseio por um amor (que eu creio ser quase impossível existir entre seres humanos comuns) que seja sábio e aprendiz, pleno e humilde, que acalente e aconchege. Um amor que não duvida. Um amor que, nós humanos, ainda temos tanto a aprender...

Uma longa reflexão que ainda continua... mas que precisava ser registrada, aqui, como a primeira de 2023.

Feliz ano velho

 E, num bater de asas de uma borboleta, este ano praticamente se foi.

Como sempre faço (não apenas na retrospectiva, mas como hábito que seguirá comigo até o último suspiro de minha vida), estou reflexiva. Pensativa. Pesando prós e contras. Vendo onde valeu a pena. Vendo onde eu errei, de novo. Me lembrando das promessas de começo de ano e o quanto eu consegui cumprir e o quanto eu falhei.

O balanço?

Bem, a gente planeja as coisas como se tudo seguisse um fluxo de raciocínio comum. É impossível prever as surpresas, nem mapa de previsões ou tarô são capazes de fazer isso. Nessas horas, estamos suscetíveis ao acaso, ao destino... ao que você quiser dar nome.

Com o tempo, percebemos que quanto mais nos acostumamos às surpresas da vida, quanto mais aprendemos a ter jogo de cintura, a relevar, a perdoar, a aceitar, a entender e a brigar onde é preciso... podemos dizer que alguém alcançou mais um nível de maturidade.

Pois acredito que maturidade seja isso: ter as rédeas da vida na mão, saber conduzir nossos cavalos, e saber continuar tocando a vida mesmo que não tenhamos mais as rédeas, uma roda se soltou, sua bunda tá cheia de calos pelos buracos da estrada.

Este ano não foi fácil. Não me recordo de um "ano simples" há mais de uma década em minha vida. Tenho bons momentos, mas esta longa estrada da vida (acompanhando meus trânsitos astrológicos) é um constante teste para saber se a minha fé em mim mesma continua firme e indiscutível. E, neste ano, eu tive provas de que sim, acho que cresci e amadureci mais um pouco. Larguei para trás os fardos da culpa e da mágoa.

No entanto, vivi mais um desafio único e inédito. E entendo que tudo que vivi até hoje me preparou para poder vivê-lo. Pois, precisei de foco, coragem, fé, humildade, resiliência e bons amigos.

Essa situação me mostrou algo muito claro: quanto menos resistência você faz com as coisas que você não quer em sua vida, mais rápido elas vão embora e menos você vai sofrer. Mas para aprender uma lição aparentemente "simples" como essa, eu tive de viver por mais de dez anos (citados acima) com dores iguais, mágoas iguais. Caso contrário, certamente, eu teria mais um carma para cumprir nesta vida. 

Não há receita mágica nem secreta para isso além disto: autoconhecer-se.

O autoconhecimento, além de matéria-prima para todos os livros de autoajuda, é uma das verdades mais imutáveis de nossa existência. Quanto mais nos conhecemos, nossas qualidades e nossos defeitos, mais podemos nos lapidar. Outra velha metáfora.

Tenho conversado sobre isso com algumas pessoas próximas a mim. E fico feliz por saber que compartilhamos de um mesmo conceito geral de que, sem se autoconhecer, não há muito para onde ir a não ser o lugar-comum dos erros e reclamações.

Não sei o que me espera em 2023. Mas sei que sem vocês - Denise, Manu, Renata, Aline, Lari, Maria Helena, Claudia, Nilce e Tamires (e outras duas pessoas que se despediram de mim e não irei mencioná-las aqui, já que elas decidiram terminar a amizade comigo) - este ano teria sido muito mais perigoso e difícil. Obrigada a cada uma de vocês pela amizade.

A todos nós, que mesmo na dificuldade, saibamos ouvir, compartilhar e falar. Pedir, se for necessário. E que 2023 traga muita saúde e luz!

Repetição

 Acho que tem um assunto que ainda não falei por aqui.

E não falar dele é como falhar em assumir uma das coisas que mais fazemos desde quando respiramos o nosso primeiro ar fora da barriga da mãe: repetir.

Repetimos atitudes que nos façam alcançar um objetivo. Que vai desde a sobrevivência, a uma simples teimosia, para realizar um desejo. Acho que a nossa vida inteira é um ato de repetição.

Repetição é rotina, diriam alguns. Repetição não é algo ruim, diriam outros. Verdade. Mas quem de nós sabe usar a boa repetição para viver? Quem de nós sabe repetir o que é saudável repetir e excluir a repetição que afeta a nossa boa saúde física e, principalmente, a mental?

Todos nós precisamos da rotina. A rotina é uma repetição forçada da nossa existência que vai se alterando conforme a nossa idade e o contexto ao nosso redor. Não gostamos de surpresas constantes, de altos e baixos. Não gostamos de ser surpreendidos e poucos de nós sabem lidar com o inusitado.

Outros já precisam tanto da rotina que não saem dela. E quanto mais a idade avança, mais ficamos enraizados nela. Cumprir uma rotina se torna não apenas um ato robótico mas uma certeza de que não é preciso mais assegurar a sobrevivência em um desafio diária caótica e estressante.

Este ano completei 45 anos. Uma idade que, quando eu tinha 30, imaginava de outra forma. Quinze anos atrás, a minha perspectiva passava por muitos fatores, menos a ideia de que a repetição se tornaria a característica mais marcante. E, não, não se trata de uma repetição positiva, mas tão maléfica quase a ponto de me matar.

E eis que, hoje, me veio essa ideia, tão forte quanto um insight e tão fraca quanto um pensamento que se esvai cinco segundos depois. Os livros de autoajuda estão aí para dar todos os termos que você quiser, acredito que o assunto nunca se esgotará porque se trata de algo crucial no ser humano.

Eu me lembrei de um curso esotérico que eu participei, uns anos atrás. Engraçado que a coisa que mais me incomodou, por incrível que pareça, foi a repetição. Me incomodava, aula após aula, continuar falando da mesma coisa. Eu não entendia aquilo. Achava que era por causa dos "idosos" da turma que tinha dificuldade para aprender as coisas.

RINDO.

LEDO ENGANO.

Os mestres espirituais não são mestres porque acham a alcunha bonita. Eles são porque já passaram por isso e sabem exatamente o que precisamos aprender. E a repetição é uma delas. Só aprendemos na repetição. Repetindo continuamente sem perceber o algo que está claro na nossa cara. E a repetição traz a mesma informação vestida de diferentes formas para que possamos percebê-la. E, mesmo assim, demoramos... ou nunca percebemos. Precisamos perder tudo, precisamos quase morrer, precisamos de um golpe de dor tão dilacerante para abrir os olhos. E, mesmo assim, ainda podemos não abrir. Sim, somos criaturas lindas, mas cegas e muito limitadas ainda.

Então, aqui, quase fechando as portas de 2022, este ano cheio de desafios únicos, conquistas únicas e experiências únicas, apenas assumo, humildemente, que mesmo tendo vivido boa parte da minha vida em um looping de repetição continuamente fazendo péssimas escolhas, eu acredito que posso aprender a escolher melhor, escolher boas repetições. Até não precisar mais repetir e criar novos hábitos.

Espero que 2023 seja bom assim para todos vocês, também!

Bem-vindo, ano novo

Dias e mais dias se passaram. Tornaram-se semanas... dois meses. 

O primeiro post do ano vem em março, no meio de um calor danado em pleno verão.

Reparei, entre as coisas do dia a dia, uma frase, uma ideia recorrente. Nada novo, por sinal. Mas que, não sei por que, veio pintado de novo, com uma sensação nova. Tudo começou com uma refrão de música "mas os momentos felizes não estão escondidos nem no passado e nem no futuro". 

Passaram-se alguns dias até eu lembrar "qual é a música?". Ao mesmo tempo, pipocando na minha retina, frases aleatórias do twitter, trechos de livros que estou revisando, estudos astrológicos que estou fazendo... "do you burn for the future or yearn for the past?".

Então, subitamente, aquela rara e gostosa sensação de paz. Rara, mesmo. Porque, para senti-la, preciso ter uma penca de fatores acontecendo concomitantemente. Mas, para minha surpresa, ao contrário. 

E eu acho que eu sei de onde vem isso. A princípio, do cansaço absurdo que eu tava de um monte de coisa acontecendo na minha vida e eu totalmente fora do controle, sem nenhuma rédea na mão, apenas contando com intuição, proteção divina e acessórios esotéricos. Mas, a gente sabe que tocar uma vida vai bem mais além desses apetrechos todos. É O CONJUNTO DA OBRA.

Acho que este livro que estou revisando agora meio que serviu pra fazer um puta de um liga-ponto gigante na minha cabeça. Um livro de um assunto que eu nunca escolheria para ler (bom, normalmente, eu não leio livros, pasmem! Só a trabalho mesmo) e que tem feito cair tantas fichas quanto um jackpot no Belagio.

É isso: o cansaço absurdo que eu tava sentindo de tudo ao meu redor virou uma reflexão inesperada sobre como cheguei até aqui, mesmo com todas as merdas que eu vivi - seja por escolha própria ou não. Eu sempre fui orgulhosa em admitir que gostava da minha vida do jeito que ela era, mas isso era uma falácia. Precisei dar mais uma bela volta no fundo do poço de merda para entender. E, hoje, eu sinto algo distinto.

Passei por tanta coisa nos últimos três, quatro, cinco anos... tanta coisa que viraria fácil fácil um livro de 300 páginas. Mas escrever esse livro seria recontar a merda e taí outra coisa que eu tô cansada de fazer. Eu sou uma pessoa sintética (a despeito dos meus áudios-podcasts que raríssimos amigos têm o prazer de ouvir hehe). Na minha cabeça se passa muita coisa até que eu resuma tudo em uma frase ou uma palavra. 

E as ordens que eu me dou neste momento são: síntese, amor próprio, aceitação humilde, ação. Muita ação.

É isso. Queria deixar registrado este momento único. Não vou prometer escrever com mais frequência aqui, mas tentarei. Ideias não faltam, mas às vezes elas simplesmente não querem se transformar em palavras digitadas.

Feliz 2022. Mais amor e menos guerra.

Para encerrar o ano de 2021

 É um fim de tarde dos primeiros dias de verão. Venta muito, um vento frio. Deve estar uns 22 graus. Uma temperatura perfeita.

Vinha adiando escrever um post, mas eis que chegou o momento. E, em uma tarde tão bonita como esta, me convidando a por meus sentimentos para fora.

A poucos dias de findar este ano, o que eu sinto é que as fichas ainda não caíram. 2021 certamente não foi o ano mais difícil da minha vida, foi o ano mais inesperado. Tantas coisas boas aconteceram! E tantas supresas tristes também.

Meus pais morreram. Oficialmente, estou morando sozinha pela primeira vez. Passarei meu primeiro natal sozinha. Quem nunca quis viver uma noite como o Kevin em Esqueceram de mim? Mas quando este momento chega, você percebe que nada é como nos filmes.

Queria ter conhecido mais pessoas novas. Queria ter aprofundado alguma amizade. O balanço geral disso é praticamente zero. E mais pessoas saíram da minha vida, umas de forma meio esperada, outras despercebida. Outras continuam presentes surpreendentemente.

Confesso que ainda tenho muito receio do futuro e uma ansiedade estranha. Por mais que você tenha todas as ferramentas para lidar com isso -- e eu tenho! -- sinto um frio na barriga aliado a uma certa falsa expectativa de que já sei como tudo isso vai terminar. 

Meus 44 anos de idade me mostram no que me tornei. E entre o oscilar de gostar e desgostar do que vejo, eu ainda gostaria de ter um pouco mais esperança e otimismo inabaláveis que já tive um dia. Talvez, eu ainda os tenha aqui dentro de mim, mas estão tão bem guardados que nem eu mesma consigo ver. Talvez, essa força -- se é que podemos chamar assim -- é tudo o que me deixa seguir em frnete mesmo quando perdi todos os motivos.

Então, com essa "força invisível", com meus 44 anos, minhas expectativas e meus objetivos, eu quero passar uma linha em 2021 e quero fechar ciclos. Estou cansada de dizer que estou cansada.

E, caso você tenha vindo até aqui ler este post, que seu 2022 seja o melhor de todos os anos de sua vida! Que tenhamos mais amor e empatia. Que possamos sorrir sem sentir culpa por isso.

Os relacionamentos em 2021

Este post é uma reflexão decorrente de um post que nem cheguei a escrever: os relacionamentos por whatsapp.

Há algum tempo venho pensando muito a respeito dos relacionamentos humanos, com base em meus próprios relacionamentos. Quantas pessoas novas conheci nos últimos cinco anos? Com quantas pessoas aprofundei minha amizade nesses últimos cinco anos? E, nesses cinco anos, o que mudou na forma das pessoas se relacionarem entre si?

Obviamente que um mísero post de blogue não começa sequer a delinear a ideia. Então, a intenção aqui é meramente refletir um momento específico e pessoal da minha vida. Dito isso, posso dizer que nunca foi tão difícil fazer amizades como agora!

E é tão estranho afirmar isso num momento em que mais podemos nos comunicar uns com os outros. Praticamente estamos online e disponíveis 24 horas por dia, 7 dias por semana. Acho que por isso e, justamente por isso!, passar da barreira do virtual para algo sólido e realmente importante além de tarefa hercúlea, eu diria que é quase impossível de ser completada.

Por que?

Estamos sobrecarregados: e vivendo uma pandemia mundial que não tem data ou previsão de terminar. Pessoas estão sendo diagnosticadas com síndrome de burnout que eu facilmente tiraria do espectro profissional e colocaria no espectro pessoal.  As pessoas estão cansadas de serem bombardeadas constantemente por mensagens, áudios, respostas pendentes etc. As pessoas estão simplesmente exaustas e algumas conseguem ter consciência disso enquanto uma parte não liga e uma outra parte sequer dá conta de que isso existe.

Interessante que o bug do whatsapp que aconteceu no dia 06 de outubro deixando todos sem facebook, instagram e whastapp afetou a cada uma de uma forma distinta. Uns ficaram aliviados por não estarem mais sendo bombardeados outros ficaram com abstinência, outros perderam dinheiro por causa de seus negócios. E, alguns, como eu, não tiveram nada maior acontecendo, porque a solidão sem alguma rede social já é mais do que comum.

Várias pessoas disseram "não gosta de ser incomodado, por que tem?" É uma pergunta bastante válida, mas muitas pessoas têm as redes sociais ou um comunicador como o whatsapp para facilitar a vida e, teoricamente, para não ficarem o dia inteiro falando com meio mundo. Seja lá qual for o objetivo pessoal de cada um, fato é a ironia de estarmos tão conectados e tão solitários. Uma solidão diferente daquela de quando apenas estávamos distantes e impossibilitados de nos comunicarmos. Pois, agora, estamos possibilitados de nos comunicar e, por opção, não nos comunicamos - escolhemos friamente (pressupondo que a pessoa tem consciência disso) com quem nos comunicar e colocamos todo o resto na lista de espera.

Eu diria que ter uma amizade verdadeira e ativa em pleno ano de 2021 significa que você não está na lista de espera de ninguém! Porque você pode simplesmente ter uma amizade verdadeira e inativa. Quase uma amizade platônica. rs

Atualmente, eu vivo essa situação: eu olho para as potenciais pessoas com que conversar e até tento conversar... mas não flui. Quando minha mãe morreu, isso fez com que as pessoas "se preocupassem" comigo e me reaproximou de algumas delas. Mas, com o passar dos meses, mesmo eu respondendo a todos, o que me restou foi o silêncio de uma resposta não retornada.

Em outros tempos, em outra época, eu ficaria muito triste e muito -- como já fiquei. Hoje em dia, eu penso e reflito. Tipo, cansei de dar o clássico murro em ponta de faca, embora eu ainda faça algo nesse sentido de vez em quando. Mas, no geral, me cansei. O que é triste! Não deveria me importar, não deveria me cansar -- eu já fui assim! No entanto... ah! Nada como a idade.

Enfim, para terminar esta reflexão de hoje e agora, se este texto chegou a você, se te tocou de alguma forma, enche o saco mesmo ficar vendo notificação do whatsapp (ainda mais se vc participa de trocentos grupos de amigos e família - eis uma coisa que nunca aceitei e participei) e perfeitamente compreensível. Mas não deixe uma facilidade moderna moldar um novo eu sem considerar o que é verdadeiro e real em sua vida.

2021, solidão e reflexões...

30 de setembro de 2021

Há exatos seis meses a minha vida mudou completamente.

Estou aqui pensando, nesta tarde de primavera de vento fresco, se eu conseguiria prever algo assim na minha vida... e a resposta é: não!

E nem falo isso pensando que foram os meus pais que morreram em um intervalo de seis meses. Não.

Falo em como a vida é o instante em que vivemos.

Só isso.

Este instante, agora, em que constantemente tomamos decisões. Porque precisamos tomar essas decisões. Porque precisamos constantemente estar em uma rota, com algum destino. Precisamos cumprir uma meta, seguir uma rotina. Este instante.

Quem nunca viu num filme a velha pergunta “se você soubesse que isso aconteceria, o que teria feito de diferente?”.

**

Eu estou me sentindo só. Mas esse é outro cenário que não foi gerado ou agravado pela morte de meus pais. A pergunta correta que eu devo me fazer é: quando eu, verdadeiramente, estive com alguém?

Eu vejo o meu cenário pessoal inserido no contexto do cenário coletivo e não consigo dissociar as coisas, não tem como. A pandemia mundial escancarou uma moléstia que atinge a humanidade desde que temos recordação: nossa total falta de empatia com o outro e o nosso egoísmo. Por escancarar assim, tem trazido, também, a urgência de sermos diferentes; de não apenas sermos para mostrarmos, mas de sermos por assim termos nos tornado.

Mas ainda é o começo.

E a minha solidão se reflete principalmente pela falta de conexão que sinto com as pessoas ao meu redor. Todos estão vivendo seus infernos pessoais (porque, afinal, o inferno não está no submundo, está bem aqui, no seu cotidiano) e todos estão vivendo seus dilemas, seus desafios, seus aprendizados. Isso me faz questionar por que não nos unimos ao invés de nos afastarmos?

Ah...

Isso me traz à tona uma antiga lembrança de 1996, quando eu tinha 19 anos e fui lá pro Japão trabalhar. Era uma época de comunicação à base de cartas enviadas pelos Correios e de fichas telefônicas para usarmos nos orelhões públicos. Estar distante de alguém fisicamente era realmente estar distante. Eu me lembro do primeiro grande (e doloroso) aprendizado que vivi lá: as pessoas com quem convivi não se uniam para se ajudar, afinal, o sintoma comum era a saudade dos que tinha ficado no Brasil. As pessoas, lá, preferiam pisar umas nas outras com qualquer tipo de superioridade que fosse (por saber o idioma local, por ser o mais velho no emprego, por ter mais experiência). Estender a mão, oferecer o ombro e uma palavra de auxílio? Poderia até rolar, mas tinha um preço que, em geral, era ser fofoqueiro e delator.

Lembro que sempre compartilhava essa péssima experiência e todo mundo me dizia que nunca tinha passado por isso. Ou seja, era EU quem tinha de vivenciar essa experiência e aprender com ela (eu e as pessoas desse grupo, obviamente).

 

**

Então, hoje, este dia com gosto, cheiro e textura especial... me faz pensar no quanto tudo mudou e no quanto eu mudei. Minha solidão sempre foi uma característica que eu tentei não ter, mas, até hoje, quantas pessoas quiseram me conhecer? Eu tenho que pagar alguém para poder ser ouvida? Quantas pessoas estão dispostas a conhecer outras pessoas simplesmente porque, apesar de tudo, nossas relações humanas são tudo que importa nesta vida, mais nada. Quem?

Sem as relações humanas não temos dinheiro, não temos sociedade, não temos família, não temos com quem nos comparar, não temos ódio nem amor. Se o ser humano não se relacionar entre si, coletivamente, não há nada.

Já aprendemos muito... e ainda temos tanto a aprender.

O que sinto agora, certamente não gostaria de estar sentindo... mas quão diferente esta solidão poderia ser, senão essa que estou vivendo?

 

Quem é você hoje?

Há algum tempinho eu comecei a reparar uma necessidade absurdamente gigante de pessoas próximas a mim de terem um perfil definido. Confesso que observei, mas, a princípio, não dei muita atenção, achei que fosse "coisa de momento" de cada um. Porque, é meio assim, né? Falo por mim mesma, quando eu me recordo especificamente desses momentos em que eu queria estar inserida em uma classificação não apenas pelo fato de ser uma definição, mas por conciliar essa atitude como um marco do meu autoconhecimento sobre mim mesma.

Décadas atrás, muito antes de internet e informação compartilhada na velocidade da luz, o que eu mais queria apenas é ser uma lésbica que não sofresse retaliação ou preconceito, que ninguém me apontasse o dedo e me julgasse e condenasse, que fizesse bullying comigo. Imagina esse cenário em 1999. Imaginou? Ao longo dos anos seguintes, até cerca de 2007, eu vivi um momento de explosão em que fui eu mesma de todas as formas possíveis, de virtudes aos piores defeitos. Eu me impunha, impunha quem eu era, porque eu queria ser aceita dessa forma e ponto final.

Hoje em dia, aos 44 anos, confesso que depois de um tanto vivido e sofrido, depois de flertar tanto com a morte e abraçar tanto a depressão e a dor, sabe o que sinto? Não faço questão de ser enquadrada em tipo nenhum. Se quiser me enquadrar, fique à vontade, porque eu mesma não sinto mais essa necessidade. Eu sei o que sou, o que ainda tenho e o que eu já perdi. Que diferença vai fazer dizer em letras garrafais X, Y ou Z sobre mim mesma? 

Estranho se sentir assim, confesso.

Então, eis que vejo as pessoas ao meu redor, especificamente desejando ser tratadas de tal forma, não aceitando ser tratadas de outra forma - só não acho justo ficar bravo se o interlocutor mais desavisado não fizer o tratamento adequado, apenas por puro desconhecimento. Eu vivi uma época em que falei para pouquíssimas pessoas "prazer, eu sou lésbica, me aceite como sou!" Até cheguei a fazer isso, mas não deu muito certo! rs

Bem, este é um post que me veio, não elaborei uma reflexão muito mais profunda sobre o assunto. Seja quem você for agora, parabéns por conseguir este esclarecimento para si mesmo. Autoconhecimento sempre será, para mim, o maior objetivo nesta vida.

O sorriso em tempos de máscaras faciais

Muito já se falou em como esta pandemia transformou completamente a nossa vida. Hoje, especificamente, quero falar do sorriso - esse movimento dos músculos faciais que fazemos para demonstrar alegria, contentamento, felicidade - e que quase nunca mais compartlhamos, por ficar escondido atrás de máscaras que nos protegem do vírus e também  de uma de nossas formas mais complexas e diretas de comunicação.

Lembro do primeiro episódio da quarta temporada de The Good Doctor em que os médicos colam uma foto de si mesmos sorrindo em seus crachás para mostrar quem são. Uma tentativa de trazer um pouco de calor em um momento tão frio e duro na existência humana.

Não vemos mais as pessoas sorrindo, mas não que elas não sorriem! Dizem que as pessoas sorriem com os olhos, vocês têm visto pessoas sorrirem assim?

Hoje, ao almoçar em uma lanchonete e já me preparando para sair, vi uma moça se sentar quase de frente para mim. Jovem, longos cabelos claros e lisos. Estava mexendo no celular com um imenso sorriso no rosto, mostrando não só dentes mas uma felicidade especial. Enquanto ela olhava no aparelho, eu tentava desvendar o que aquele belo sorriso queria dizer: uma notícia feliz? Um amor correspondido? Algo me diz que era essa opção.

Naquele breve instante, eu me apaixonei por ela e seu sorriso. 

Porque parecia tão franco, tão honesto, tão simples - quase ingênuo. O amor (ou a paixão) em todo seu início sempre tem disso, não é? E eu confesso que perdi um muito disso, dessa doçura humana. Estamos sempre escondidos atrás de medos, inseguranças, desconfianças... ver um sorriso como o dela atingiu algo dentro de mim naqueles milésimos de segundos.

Naquele breve instante, eu desejei ser o objeto e a razão de seu sorriso.

Porque eu simplesmente queria viver um sentimento livre do peso dos traumas, das acusações, das condenações. 

A lembrança de seu rosto já se mistura com tantas outras e nem saberia mais dizer como ela é. Mas o seu sorriso... Um breve sorriso que me aqueceu e que me fez sorrir junto com ela - eu, escondida atrás de minha máscara, protegida contra qualquer argumento alheio. Um breve sorriso que me fez teleportar momentaneamente para aquele porto feliz que todos nós merecemos eternamente estar.

Moça, sei que a felicidade é um instante, que se constrói e descontrói, que se faz e desfaz num piscar de olhos. Moça, sei que a felicidade não é eterna e nem o nosso objetivo, mas desejo que sua felicidade lhe seja boa e eterna enquanto dure. Agradeço por ter compartilhado esse lindo sorriso comigo, eu me apaixonei e me encantei com ele e nunca mais o esquecerei!

Por que precisamos comparar?

Uma das coisas mais inevitáveis da vida é o ato de nos compararmos a alguém.

Não tem jeito!

E isso pode ser algo tão obsessivo que simplesmente podemos basear a nossa vida toda e qualquer atitude dela em uma comparação. Podemos simplesmente congelar por não saber o próximo passo sem conhecer o paralelo de se comparar a algo ou a alguém.

ISSO É MUITO SÉRIO, GENTE!

Esta ideia me ocorreu e mesmo eu pensando nela há algum tempo, nunca tive tempo de sentar e ordenar as reflexões. Faço agora, antes que perca o fio da meada.

A vida pessoal de alguém sempre parecerá mais feliz que a nossa. A vida profissional de alguém sempre mostrará mais brilho que a nossa. A família de alguém sempre será mais doriana que a nossa. O relacionamento de outro sempre será mais instagrameável que o seu (isso, se você tiver algum).

Fato é que a vida de uma outra pessoa, sob o nosso ponto de vista, sempre será mais feliz, mais completo, mais luxuoso... mais qualquer coisa que você queira que seja. Porém... esse será um fato verdadeiro, imaginação sua, exagero seu ou pura maquiagem para vender uma imagem?

QUEM SABERÁ?

Li um livro recentemente (só leio livros a trabalho, [in]felizmente) que fala sobre ansiedade e sobre focarmos as lentes em nós mesmos como uma forma de lidar com essa necessidade de olhar o outro antes de olharmos para nós. Esse é um assunto tão complexo que pode render vários livros, debates.. e este post, humilde, que aqui compartilho.

Me peguei me comparando... e me senti feliz por saber que minha qualidade profissional não é tão ruim assim, afinal, a pessoa da comparação trabalha em um lugar conceituado e percebi que seu trabalho é tão bom quanto o meu. Nossa, Cris, que triste você precisar googlear tudo isso para chegar a essa conclusão. Pois é...

Na verdade, eu sei que eu sou boa. Mas diversos fatores (falta de comunicação, isolamento social, isolamento real, neuroses diversas, ansiedade, silêncio) podem criar um terreno fértil irreal que, dependendo da sua situação mental, podem gerar ervas daninhas que, com o tempo, dão frutos horríveis que você mesmo vai comer e vai se envenenar. E termina que você se acha um profissional da pior categoria que merece o ostracismo e a danação eterna de fica sem trabalhar.

Futuramente, indico livro aqui. Por ora, compartilho a dica que sempre dou para mim mesma, uma lição dada por Jordan Peterson [veja um vídeo, em inglês, dele].

Traduzindo: Compare-se com quem você foi ontem, não como uma pessoa está hoje. [aceito sugestões de uma tradução melhor]



Sobre "You" (Você, série da Netflix) em minha vida

Este aqui não é um post para fazer análise crítica!

Eu sempre tive uma atração muito grande sobre psicopatas, psicopatia e seus assuntos correlatos. Li alguns livros, vi muitos documentários, assisti a alguns filmes. Infelizmente, não pude ter o privilégio de conversar a respeito - muito provavelmente pelos razões óbvias: ou as pessoas não se interessam ou as pessoas são ignorantes mesmo (no sentido de não conhecer).

Certamente, meu primeiro e eterno "amor" será sempre Hannibal Lecter. Personagem esse que foi forjado juntando tantos outros psicopatas, um gentleman eternizado pelo ator Anthony Hopkins. Mads Mikkelsen fez um excelente trabalho ao interpretar esse personagem, mas compará-lo com Hopkins é covardia, então nem tentemos.

[ Em muitas vezes, penso que minha verdadeira vocação jaz na Psicopatologia forense, na Psicologia criminal ou na Psicologia forense. Ou Perito criminal. Eu, verdadeiramente, amo esses assuntos: o mundo da mente doente e perversa e dos quebra-cabeças resolvidos pela coleta de provas e evidências. ]

O cinema fez bons filmes e retratou bem serial killers famosos. Mas criar um personagem NOVO, fresco, atual, vivo e tão real é tarefa para poucas produções. You (Você) série da Netflix de 2018 merecia um post meu desde a sua estreia, mas somente agora posso comentar.

Eu sempre me senti um pouco como Joe Goldberg: apaixonar-se por um alvo específico. Seu lado stalker, obsessivo, perfeccionista, dedicado, intenso... Lembro das minhas primeiras reações, parecia que eu me via retratada na tela. Era incômodo e ao mesmo tempo bom: e essas duas sensações não deveriam andar juntas!

Não tenho vergonha em admitir que já fui, em graus incomparavelmente menores, como ele. E ainda posso ser, se quiser. Teria testemunhas que poderiam corroborar o que digo, mas elas se foram... (rs, não, não matei ninguém!!! Não possuo esse nível doentio de psicopatia). Se foram. Algumas precisei matar dentro de mim, porque elas poderiam continuar vivendo como as lembranças que Joe tem das mulheres que ele amou e ainda o assombram.

Hoje, abril de 2021, resolvi baixar para rever tudo. Primeiro porque foi nesta série que descobri Elizabeth Lail e me encantei pela atriz. Como queria revê-la (ela não tem muitos trabalhos além de Once upon a time e o filme Countdown), nada como rever a série. Revi tudo em um dia, como uma forma de descansar minha mente - objetivo que alcancei -, no entanto, ruminei essa sensação de ter sido tão Joe Goldberg para algumas pessoas em minha vida... (Uma vez, lá nos idos de 2002, eu descobri a senha de uma pessoa que, depois e por causa disso, descobri ser uma mentirosa patológica).

Interessante que, há algum tempo, estou vendo uns documentários feitos por um canal do YouTube chamado Operação Policial que traz imagens reais de investigações e opiniões de profissionais como Rosangela Monteiro, Guido Palomba em casos midiáticos como o Maníaco do Parque, Susane Von Richtofen, entre vários outros. Não me recordo agora em qual caso específico foi, mas a descrição dada a assassinos, em especial os passionais, também me causou um reconhecimento e um desconforto.

Claro que eu já tinha notado, analisado e refletido sobre esta minha característica tortuosa que é a forma como me relaciono amorosamente com as pessoas mais íntimas de minha vida. Não é legal. Certamente, se eu tivesse tido uma outra infância, uma outra família, outras experiências, haveria lá aquela possibilidade de eu fazer algo de que pudesse me arrepender depois.

Recentemente li um livro escrito por um psicanalista, que foi um dos trabalhos mais prazerosos que já pude fazer. Assim que o livro sair para venda, divulgo. Por enquanto, apenas afirmo que ler o livro me fez enxergar ainda mais sobre eu mesma. Sobre CARÊNCIA esse monstro que habita tantos seres humanos por aí... A carência que atormenta as pessoas e atormenta algumas tanto a ponto de fazê-las cometerem atrocidades. Mas, não se engane, não é preciso tirar a vida de alguém para que seja uma atrocidade, traumatizá-la e deixá-la com vida pode ser bem pior...

Enfim, escrevi este post porque li uma pessoa me mandar uma mensagem com a frase "Estou com saudade de vc" e isso acionou múltiplos gatilhos em mim. Me vi tendo conversas ao estilo de Joe Goldberg, ainda mais porque eu ainda tenho um pequeno cartaz colado em minha parede me dizendo que "essa pessoa morreu e está no passado".

O que vai acontecer agora? Bem... como não sou o Joe, não farei o que ele faria. Farei o que é necessário fazer: seguir em frente. Sempre em frente.

Sobre a morte

No dia 30 de março de 2021, meu pai morreu em decorrência de um AVC que ele teve cinco meses antes.

Antes disso, vi a morte algumas vezes, quando minha tia morreu, em 2000, após um câncer violento. Vi outras pessoas falecerem. Flertei com a morte eu mesma. Conheço uma pessoa de quem vi as cicatrizes de sua tentativa de suicídio.

"Quicker and easier than falling asleep."

E sempre observei a forma como as pessoas lidam com a morte e, consequentemente, com o ato de morrer. Confesso que sempre senti fascínio por esse sentimento que varia tanto conforme a pessoa. Na minha modesta opinião, os que mais temem a morte costumam ser os mais apegados à matéria - seja ela palpável ou não.

Morrer é apenas mais um passo na nossa cadeia evolutiva. Mas o fato de não sabermos se dói, se acordamos depois, o fato de deixarmos tudo para trás causa uma impressionante angústia nas pessoas. O fato de acompanhar todos os passos desde o último respiro de vida do meu pai, seu sepultamento e a reação das pessoas ao saberem que um idoso de 80 anos morreu de um infarto, após passar cinco meses sem andar e dependendo totalmente de outras pessoas para praticamente tudo (exceto comer) - me fez observar o que me era dito, não dito. Palavras de pesar, reflexões compartilhadas, providências tomadas.

Acredito que a maioria não acredita em nada: do tipo, morreu, acabou. Do pó viemos, ao pó retornaremos. A pessoa morreu, a vida segue.

De fato, morreu está morto. Mas compartilharei meus primeiros sentimentos: eu flertei e quase casei com a morte por duas vezes nos últimos dois anos de minha vida. Pensei: teria sido assim se fosse eu a morta e não meu pai? Eu veria as pessoas lamentando com a minha mãe e minha irmã o fato de eu ter me suicidado?

Pensei muito isso. Mas já passou. E passou porque decidi engrenar uma fase nova em minha vida bem antes de meu pai morrer. O fato de ele morrer em meio a uma pandemia mundial - mas não morrer por causa dela - por outros fatores parece mexer ainda mais com as pessoas, em especial as com mais idade. Como se a morte escolhesse alguém por faixa etária...

Na realidade, o grande fardo de alguém morrer jaz com os que continuam vivos: seja pelo pesar de não ter feito algo, dito algo, guardado rancor. As oportunidades se foram e efetivamente não voltam mais. O arrependimento é uma eterna e amarga bala a ser chupada todos os dias, se a pessoa não decidir cuspir ou engolir de uma vez.

Muitos choram os mortos pela saudade... realmente, é estranho pensar que nunca mais veremos alguém além de uma fotografia (ou vídeo). Se a morte foi repentina, então, esse sentimento é infinitamente multiplicado. E, assim, as pessoas podem viver uma vida inteira sem virar a página, começar um novo capítulo. Nosso apego não nos permite a transformação, talvez, porque pareça uma perda dupla. O que ninguém se lembra é que o que é verdadeiramente nosso nunca é esquecido ou se perde.

Então, fica aqui aquela velha frase clichê: aproveite e faça tudo enquanto a morte não chegar. Dissolva mágoas, resolva situações, fique bem.

Eu sonhei com meu pai no dia em que completou uma semana de sua morte. Não costumo sonhar com mortos ou ter esse tipo de "sonho visita" (minha mãe é que sempre foi a especialista nesse assunto). Mas, por ironia, desta vez fui eu. Sonhei com meu pai surgindo do nada, mais novo, alegre e com uma energia positiva como nunca o vi em vida (ele sempre tinha cara fechada, feia e exalava uma aura densa e carregada) em uma casa que parecia com a que moro porém mais nova. Ele veio e disse "voltei, estou bem". Fiquei tão assustada com a situação que não consegui me expressar. Tudo era normal e natural e eu ainda pensava que tinha visto ele ser enterrado poucos dias atrás. Foi um sonho nítido que certamente eu nunca mais esquecerei. O que significa? A interpretação fica por conta de cada um. Se foi meu subconsciente me dizendo ou não o que eu queria ouvir (e nem sabia, claro) - não sei. Mas gostei de ver meu pai, uma última vez, de uma maneira como não o tinha mais visto havia tanto tempo que nem lembrava mais.

Uma breve reflexão sobre furar fila

 Assunto do momento: digite no Google e você vai se deparar com muitas links para matérias de todos os tipos e gostos. Tornou-se a moda, infelizmente. Mas furar a fila é algo que não saberia dizer se é cultural ou brasileiro. Não me aprofundei nesse assunto.

Eu sempre fui veementemente contra furar a fila em quaisquer circunstâncias. Considero isso não apenas um desvio de conduta de caráter, uma total falta de respeito ao próximo. Então, na minha concepção, praticar esse ato - além de falta de educação - também simboliza um gesto de egoísmo praticado sob os mais diversos argumentos. Todos condenáveis, exceto em caso de uma pessoa em iminência de morte.

Veja, por isso existe um protocolo que você encontra em qualquer UBS que você for: é a classificação de risco. Isso é o que faz você esperar por horas para ver um piriri suspeito enquanto o que está com suspeita de infarto passe na sua frente. 

Óbvio que levar isso para a vida cotidiana seria algo muito além de qualquer expectativa. As pessoas furam fila de supermercado, do banco. E para pegar condução lotada? Só sabe quem já passou por isso. Não existe respeito. É cada um por si.

Vemos as pessoas furando fila nas situações mais comuns do dia a dia. E esse comportamento tornou-se tão grave agora em tempos de pandemia, que foi necessário criar leis e multas severas para quem chegar dando carteirada: porque é mais importante, tem mais poder ou tem mais dinheiro. Todos aqueles cenários caóticos que vimos em filmes de fim de mundo estão acontecendo agora, ao vivo e a cores, diante de nossos olhos.

Uma vez, furaram a fila para mim. Tenho vergonha desse dia, mas vou contar aqui, acho que nunca contei. 

Eu odeio filas, de todos tipos. Fila é algo tão imbecil mas tão automático que quando menos percebemos estamos lá, numa fila. A fila parece trazer uma certeza de que vai dar certo, mesmo que demore. Talvez (e bem talvez) por isso, a vida traga os engraçadinhos e espertinhos que passam na frente - eles sabem que isso é uma afirmação perigosa e até mentirosa.

Estava eu em uma fila para o camarim pós-show da Isabella Taviani em Brasília, dez anos atrás. Sim, tinha viajado de São Paulo para vê-la onde tudo é plano aonde quer que você olhe. Estava eu lá, esperando chegar a minha vez, como sempre faço, quando o produtor viu a galera que tinha vindo de SP (ninguém combinou de ir junto mas todos se encontraram lá) umas seis pessoas, eu acho, não lembro mais, e chamou todos para irem primeiro falar com a cantora. Eu disse que não queria, esperaria a minha vez, mas fui forçada a ir. No meio do caminho, ouvi muita gente reclamando e algumas me xingando. Caminhei pedindo desculpas. Oras, a Isabella fazia uma década que não se apresentava lá e eu, nessa época, ia a shows delas duas, três vezes por mês. Podia esperar, mesmo tendo vindo de SP. Mas, não, passei na frente de todos.

Qual a sensação que traz ser a primeira, passando na frente de todo mundo? Eu sou especial e única.

E acho que é isso que todos desejam ratificar: sou especial e único, posso passar na frente dos outros. O sinistro é ver que as pessoas ainda continuam pensando assim, sem o mínimo de pensamento coletivo, no meio de uma pandemia, uma situação gravíssima, ainda mais agravada pela péssima gestão governamental (que nem merece comentário aqui). Se eu tenho dinheiro e influência, então por que não posso passar antes de todos?

Brasileiro tem aquela péssima fama de "dar jeitinho em tudo". Não sei de onde herdamos isso (aceito explicações antropológicas e históricas). Embora a bandeira diga "Ordem e Progresso", estamos longe de realmente por isso em prática. A lei máxima é do esperto que agarra a sua oportunidade, mesmo que burle regras. Se eu posso, qual o problema? Todo mundo terá o seu, só que eu terei primeiro.

Nada a ver, mas isso me fez lembrar do único show da Alanis Morissette que fui, lá em 1999. Fila para entrar, horas e horas esperando a casa abrir... quando entramos, uma menina disse em alto e bom tom que seria bom para todo mundo esperar sentado no chão o show começar, que ela tinha ido em shows lá fora (?!) e era assim. Claro que ninguém deu bola para ela. Foi nesse show que, inclusive, vi minha primeira roda se abrir na minha frente e eu quase fiz nas calças por medo de ser jogada ali no meio. Como assim, abrir a roda num show da Alanis?

Talvez seja do ser humano, instinto de sobrevivência jogando hormônios no corpo em um momento tão tenso e inédito que vivemos, como brasileiros que nunca viveram uma guerra, um tsunami ou um terremoto. Outras pessoas de outros países estão "mais acostumados" mas o brasileiro, não. E, talvez por isso também, o caos tenha se instalado da forma mais inimaginável possível: com negacionismo. Tipo, isso não está acontecendo aqui, é tudo invenção de alguém.

Agora, com a ficha caindo, o desespero das pessoas para furar fila e sobreviver só mostra o que sempre fomos com requintes de crueldade: não fazemos a nossa parte, não quero pagar a conta e quero sobreviver e ser feliz. O resto que se cuide.