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Um poema (antigo)

Hoje acordei com um verso de um poema, que escrevi há mais de vinte anos atrás, na cabeça. Já não me lembrava do título... apenas de um verso.

Liguei o computador e vim caçar. Achei.

Escrito no dia 20 de maio de 2001, quando eu ainda usava o pseudônimo "Kris de Sousa", mostra uma Cris antiga, que ainda não tinha vivido uma cesta de experiências, tinha acabado de começar a fazer o curso de Letras na USP e carregava sonhos e uma coragem que... bem... eu ainda as tenho. Apenas em outro formato.

A linguagem aqui é mais formal e rebuscada, algo que abandonaria em breve. Mas esse poema, apesar de estar nessa roupagem, é muito visceral. E não foi nada à toa eu ter acordado com ele na cabeça...



Baile

Ao baile dos poemas, entreguei-me na noite passada

e mesmo no silêncio mudo, misterioso... inquiridor

tenho os vestígios: resquícios de sua arte, sua dor

e acordei com palavras tristes... mas abonadas,

perguntei ao relógio do tempo que não é tempo,

mas mera figuração, idolatração: passatempo.


Ao baile da ansiedade cheia de escárnio, chorei

lágrimas, e com elas, fiz tinta que usei em pena

em alusão à mulher que tanto me traz cenas

em sonhos, em pesadelos: marquei-me, esperei,

mas o silêncio da solidão foi duro e taciturno

minhas mágoas não encontraram momento oportuno.


E tremi...

entre transes 

de ópio e morfina,

pretendi...

esquecer a vida 

que desatina,

malogrei...

sangrei...

dei...

ao obscuro

o que não tinha,

e busquei

não em mim

mas fora

... de mim...

o que

só em mim

havia...


Ao baile da solidão eterna o tempo todo eu compareci,

dias e noites, madrugadas e manhãs vazias, mal vividas

os estranhos me serviram de companhia para a sina

que eu escolhi e pretendi, e que não sabe que adoeci,

mas acordei com palavras e poemas, perfeitos,

que saberão, em sua sapiência inviolável, dar-me preceitos.