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Coração deserto (poema)


Se eu fechar os olhos por um momento
talvez eu seja capaz de desenhar o meu futuro
e este será o instante em que não sentirei ansiedade nem angústia
todos os temores se dissiparão eu conseguirei sorrir livremente.
Pois que o presente seja tão incerto quanto as lembranças do passado
e o futuro sempre reserva uma fração de esperança
para os sonhadores, raça quase extinta, seres humanos
fadados à dor, à solidão… quase como eu e você.

Mas se você fechar os olhos por esse instante
talvez você não consiga ver as coisas que eu vi
como em sonhos premonitórios, quando nunca é dia ou noite,
seremos duas almas separadas, cada uma trilhando sua própria linha
não nos encontramos, não iremos nos reencontrar
e a espera será apenas mais uma característica de personalidade
quase uma cicatriz, um verdadeiro defeito congênito,
e o que restar será compartilhado como migalhas para pombos.

Eu vou fechar os meus olhos por um momento
esperando que alguma coisa mude entre o segundo do desejo e o do desespero
uma fração de um milésimo de um minuto para o fim
se parece ser muito mais fácil desistir, eu escolho continuar
todos os meus passos já são conhecidos, minhas intenções
então nada restou para descrever ou para conversar, nada,
e comigo mesma eu ficarei com mãos vazias, corpo vazio, olhos vazios
uma alma despedaçada e vazia… sem migalhas para mim mesma.

Eu vou fechar os meus olhos por um momento,
e numa suposta prece que eu nunca rezei, eu vou pedir
que a compreensão seja mais ampla que pré–julgamentos
pois mesmo que a vida seja cíclica e eu assuma meus compromissos
o primeiro sinal de silêncio vai aliviar a angústia desta alma
para nunca mais calar o silêncio de um espírito solitário,
nunca mais haverá manhã ou noite em que o eco de uma voz
não será refletido de volta para o mesmo espelho vazio,
a compreensão e a empatia não são características do ser humano,
mas mesmo assim eu peço que olhem do meu ponto de vista e compreendam
o que os olhos humanos não vêem jamais, o que corações não sentem
o que almas vazias como as de vocês jamais perceberam
e me deixem ir com os olhos fechados e um sorriso nos lábios.

Então, não feche seus olhos comigo, nem por dó, nem por imaginação
assim, só e feliz, eu permanecerei entre cinzas e lembranças
pois é triste saber de alguém que passou por sua vida e nada deixou
eu passei pela minha própria vida e acumulei todo o conhecimento possível
tentei auxiliar, tentei compartilhar e como eu tentei me integrar,
mas o ar sempre é muito denso… ou eu ficava na superfície, ou no fundo do âmago,
e entre a angústia de nunca saber onde permanecer eu decidi sublimar
decidi que não era mais minha escolha, nunca tinha sido minha escolha,
o meio–fio de minha decisão era a minha maior e única decisão
e quem quer que caminhasse pelo meu coração, nunca deveria ter esquecido
que em um coração deserto, apenas se caminha sozinho.

(por mim, em 20/11/2006)

Tomorrow never dies

Após mais um fim de semana, após finalmente ter visto Into the wild, eu acordei com algumas perguntas, que não sei se deveriam ser feitas por uma mulher nos 32 anos de idade, como eu.

1- não é triste ver que alguns de seus contatos, antes amigos, agora se resumem a meros forwards na sua caixa de entrada?
2- a rotina das pessoas na segunda-feira, de uma São Paulo cinzenta, cabisbaixas, fumando seus cigarros fedorentos, com o cheiro da preguiça de tomar banho.
3- uma necessidade intrínseca de fugir, mas sem ter, literalmente, pra onde ir?

Pois é. E saibam que ainda tô com o filme na cabeça. As paisagens e o cenário são lindos... de uma beleza instigante, refletindo a alma do personagem -- me lembrou Brokeback Mountain.

Desde a pré-sinopse que eu não li (apenas ouvi falar) eu sabia que o personagem principal ou era aquariano ou sagitariano. Embora apostasse minhas fichas no segundo, não me admirei enquanto subiam os créditos, que a data de nascimento de Christopher McCandless fosse 12 de fevereiro.

Algo ainda me incomoda neste filme. Acho que ele é idealista demais ao achar que vai encontrar a felicidade assim. Como ele mesmo diz no fim "Happiness is only real when shared." Tarde demais para perceber. Eu acrescentaria "os piores confins para adentrarmos são os nossos próprios."

Porém, concordo literalmente que se tivermos de escolher a melhor expressão de Deus seria na Natureza. Ela é perfeita, equilibrada, com seu mistério justo, balanceado -- algo que os seres humanos nunca conseguiram copiar.

Enquanto isso, vamos ouvindo Tomorrow never dies e The world is not enough, em homenagem a este post. Bond foi mera coincidência.

Book signing com Cláudia Trevisan

Pra encerrar a semana de eventos (coisa rara na minha rotina!) fui à noite de autógrafos da autora Cláudia Trevisan, ontem, na Livraria Cultura.

Jornalista e correspondente na China para o Estado de S.Paulo, considero a Cláudia uma excelente escritora. Na minha opinião (e relembrando Aristóteles, Joaquim Aguiar e Antonio Candido), erudição não quer dizer texto hermético. Muita gente se esquece disso e confunde conhecimento com pedantismo. Não é o caso da Cláudia. Ainda mais que tive o privilégio de trabalhar pessoalmente com ela durante a produção do livro. Tarefa difícil e ingrata, visto que eu estava em SP, Brasil e ela estava na China! Apenas a logística foi ingrata, os emails trocados foram muitos e em nenhum momento, com trocas e destrocas, correções e inserções, perdemos a paciência uma com a outra. Foram muuuuitos emails trocados.

Nisso, acabei me afeiçoando ao seu estilo, sua inteligência, suas fotos lindamente tiradas. Ao longo de 4 meses de produção, eu fui vendo seu rebento crescer até a tomar a forma final de livro.

Ontem, ele ficou pronto e foi apresentado ao público. Antes disso, teve entrevista no Jô Soares. São vídeos divididos em cinco partes e vale a pena ver.

O Diego Jock, libriano fofo do Marketing da Contexto, tirou fotos. Devidamente postadas aqui + a dedicatória da Cláudia!


















Album signing com Zélia Duncan

Como prometido a mim mesma, eu e minha sis fomos ontem ao lançamento do novo cd da Zélia Duncan Pelo sabor do gesto. Com um pouco menos de pontualidade do que eu queria, cheguei na Livraria Cultura às 18h45. Considerando que saí do Alto da Lapa às 18h00, cheguei cedo. Encontrei com minha irmã e ficamos na fila esperando. Exatamente às 20h40, fomos atendidas por uma graciosa Zélia Duncan de chapéu, uma camiseta com a frase "It's never done" e simpaticíssima com cada uma das pessoas que estavam na fila (não foram muitas, calculo umas 300). Claro que até lá, eu fiquei observando as pessoas, a quantidade sempre admirável de sapatas e casais de sapatas -- umas disfarçadas, outras descaradas --, o que sempre me faz pôr em prática meu lado antropóloga-Crisão que quem me conhece, sabe como é sagaz e ligeiramente maldoso.

Enfim... quando chegou a nossa vez, eu estava ansiosa! Fui uma única vez ao show da Zélia há muitos anos atrás! Imagina. Abriu um clarão e eu entrei com os braços abertos (como se estivesse revendo a minha melhor amiga) e fui correndo abraçá-la. Enquanto a abracava, disse: "É um prazer poder te conhecer pessoalmente!". Ne
m lembrei da minha irmã. Achei estranho, mas achei que ela estivesse de lado, olhando, já que disse a ela que eu seria bem sagitariana. Ela falou que estava meio tímida (bem canceriana...). Disse para ela "deixe de ser boba, isso não é hora de ser tímida!". Enfim.

Peguei o encarte com a página devidamente escolhida e entreguei a ela. Perguntei se eram dela as belíssimas aquarelas que compunham o encarte todo. "Não... são de Brígida Baltar", respondeu ela sorrindo aquele sorrisão só dela.

Nisso (finalmente!) me toquei que minha irmã tava longe! Chamei ela! "Vem aqui!!!". E disse para a Zélia "Esta é minha irmã!" E ela respondeu: "Irmã tímida!" Enquanto isso, minha câmera, nas mãos de uma loira, apenas esperava a hora de bater a foto das três. Aliás, foi essa mesma loira que impediu a entrada de minha irmã que, educada e tímida, nem repeliu a loira. Ah se fosse comigo...

Minha irmã se aprochegou, abraçou a Zélia com bem menos efusão que eu. Aí fomos para o autógrafo: Cris e Tati. Eu fiquei vendo ela escreve
r. Nos arrumamos pra foto. RÁ: pus a mão na coxa dela, para me apoiar. Não tinha como evitar, né???.... Ao final, eu disse a Zélia: "E vc vai fazer um reality show igual à Isabella Taviani?" Ela deu uma sonora gargalhada e respondeu: "Nãooo só a Isabella mesmo!!" Eu respondi: "Eu vi o vídeo seu e da Isabella e adorei!!" Ela deu outra gargalhada e ela disse "A Isabella é louca!". Rimos e fomos, eu minha sis.

Foi fantástico, mas não tinha como não falar desse vídeo. As duas juntas são muito engraçadas.

Voltei para casa andando nas nuvens. Nessas horas penso que temos de valorizar nossos artistas -- os brasileiros que estão aqui -- pois eles podem realizar aquele sonho de fã de abraçar, rir e chorar. Nada contra os gringos (praticamente inalcançáveis), mas nenhum deles me deu as alegrias que Ana Carolina, Isabella Taviani e Zélia Duncan me proporcionaram até agora.

BTW, ainda tô ouvindo o CD. Uma graça... doce, leve.

Ode to my family

Ontem, voltando pra casa numa São Paulo chuventa a semana inteira, me ocorreu algo: eu quase nunca falo da minha família aqui e para ninguém. Fiquei com a pulga atrás da orelha.

Acho que como toda boa lésbica (e algumas devem viver este confronto até hoje), eu também senti e ainda sinto os efeitos de não ser uma "normal da sociedade", que tem filhos aos 30 anos, prestação de casa, carro na garagem... como tinha dito minha amiga Gabitchs no blog dela. Mas, dentre todos esses confrontos, eu trago boas lembranças de minha família e de minha infância. Tudo ainda é questão de ponto de vista e de como você lida com o que é inerente a você.

Da minha irmã, eu sempre vou me lembrar dos salgadinhos Ruffles e de quando ela mordeu meu olho, sendo uma bebezinha de meses, e quase me cegou. A gente não se dá muito bem, mas a gente se respeita e se gosta.

Do meu pai, vou sempre recordar das canções de ninar antes de dormir e de como é bom deixar a barriga sempre aquecida durante a noite, para não ter cólicas. E de como é bom gostar de desenhos e ser eclético em música. E de como nunca ser um pisciano em seus piores defeitos.

Da minha mãe, eu tenho as melhores recordações. Ela me ensinou a ser forte, independente e simpática -- características muito impossíveis para uma canceriana com ascendente em peixes e lua em leão. Eu sempre fui retraída e tímida e tinha vergonha da minha mãe com seu jeito sagitariano e espontâneo de ser.

Minha mãe me ensinou que devemos ser respeitados pelo que somos. A vocês confidencio que sempre sofri por ser japa. Imagina ser uma japa lésbica! Minha mãe, inconscientemente, me incutiu a regra de que você deve ser quem você é, fazer o que você gosta. Ser sempre alegre e acreditar.

Além do lance de repetir à exaustão que se não temos ninguém para nos ajudar, não devemos sentar e lamentar, mas sim correr atrás daquilo que é necessário. Isso vai desde trocar uma lâmpada a arranjar um emprego.

Hoje em dia, tenho muito de minha mãe em mim. E tenho muito orgulho dela. Mesmo que eu saiba que ela nunca leria este blogue, este post de hoje é, basicamente, uma homenagem a ela.