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GAP — The series: minha review

Tailândia.

Minhas únicas referências eram culinárias (assim como quase tudo que se refere ao sudeste asiático) e o fato de que se trata de um dos países onde mais se realizam cirurgias para mudança de sexo. Sabia disso porque tinha visto a apresentação que viralizou em 2011, do Thailand's Got Talent, da Bell Nuntita.

Nunca, mas nunca imaginei que viria desse país uma série com temática estritamente lésbica que me encantaria. NuncaA série se chama Gap: The Series e é baseada no livro homônimo escrito por Devil Planoy.

Lembro do burburinho que rondou o twitter no final do ano passado. Mas estava com muitos problemas pessoais para pensar em encarar uma série lésbica, já que a maioria delas não me agrada — seja pelo foco nas adolescentes, seja pelo excesso de drama, ou, ironicamente, pelo excesso de futilidade. Tantas e tantas séries por aí... nunca vi nenhuma. No ano passado, ainda, estava encantada com a fanfic escrita pela Brullf que, na minha humilde opinião, é uma das mais lindas histórias ficcionais já escritas. Já tinha falado por cima dela neste post aqui. Então, queria manter o calor que o texto tinha me deixado em mim. Um calor com cheiro de esperança e muito amor. 

Mas, esta semana, vendo mais uma review de um canal que sigo no YouTube, resolvi dar uma chance, enfim! Gosto muito do que essa moça fala e o título do vídeo nada mais é "a série que elevou o patamar de todas outras séries lésbicas". Essa é uma baita afirmação! Bem, vamos lá. Tá tudo disponível de graça no YT, com legendas em português, o que custa? 

Para mim, o que levo em consideração ao ver uma obra audiovisual, como um filme ou uma série? Coesão e coerência, da mesma forma que vejo ao analisar um texto ou um livro. E eis a primeira coisa que me chamou a atenção: a direção simples, direta e bem segura. As cores determinando os tons das personagens. O tom cômico oriental que não estamos acostumados a ver por aqui, com tiradas e piadas até ingênuas mas engraçadas dentro do contexto da história. A normalidade em aceitar todos como são: lésbicas, gays, butches.

A Tailândia é um país majoritariamente budista. E essa é a justificativa mais plausível para o país ser um dos que mais faz cirurgia para mudança de sexo, mesmo não aceitando o casamento entre homossexuais. Com todo o nosso aparato católico-cristão, acreditamos em bem e mal, deus e o diabo, julgamento e condenação. Nesta série não tem nada disso e o resultado inicial que temos é que estamos diante de um verdadeiro conto de fadas onde as pessoas têm comportamento tão incomuns para nós, ocidentais, que parece falso e ficcional mesmo.

Isso não quer dizer que não haja repressão por lá, mas ela é encarada de outra forma. E essa repressão vem na forma da Grandmother, a avó — principal antagonista da série —, que personifica o velho, o autoritário, o antigo, o conservador. Ela faz tudo que não queremos que ela faça: e chega uma hora que queremos que ela morra mesmo, como uma das personagens diz no último episódio.

(alerta de spoilers, hein!) 

A história central se passa entre as protagonistas Mon e Sam, vividas respectivamente por Becky e Freen (não me peça para tentar escrever o nome em tailandês!). Variando habilmente a inserção de flashbacks para conhecermos a história das personagens, sabemos que elas se conheceram ainda muito pequenas. Sam é a mais velha e Mon a mais jovem que se inspira nela por causa de sua gentileza e, a partir de então, conduz toda a sua vida se espelhando em Sam, uma representante da alta hierarquia social, vinda de família extremamente rica. Mon, por sua vez, é pobre (mesmo que more numa linda e maravilhosa casa) mas segue os passos de sua ídola até poder conseguir trabalhar como estagiária na empresa de Sam.

O que mais se comenta das duas personagens diz respeito da química entre as atrizes. E isso é fato, sabemos que para um casal dar certo diante das câmeras, é necessária química entre as pessoas por trás dos personagens. Inúmeras entrevistas de casais notórios das telas falam disso. Em tantas vezes essa química vai além dos personagens e os atores envolvidos acabam namorando, casando. Essa química é necessária para poder trazer a veracidade para os espectadores.

Porém, no início a química está no polo da repulsa, a extrema repulsa de Sam por qualquer pessoa que lhe pareça alheia, estranha, incompetente. Sam, ao contrário do Mon imaginava, não era mais gentil, mas uma impiedosa sem coração. Não sabemos o que aconteceu na vida de Sam para que ela se tornasse assim. Mon, em contrapartida, encarna quase um personagem infantil, ela se veste apenas de rosa, rosa com unicórnios, seu rosto é angelical, seu olhar é doce — todos dizem a mesma coisa quando a veem pela primeira vez. O outro lado temos Sam que apenas se veste de preto, músculos da face que nunca exibem um sorriso (exceto quando vai demitir alguém) — quase um diabo vestindo Prada.

O desenvolvimento das personagens que, inevitavelmente sentem uma atração impossível de controlar uma pela outra, é outra coisa maravilhosa de se acompanhar. Aliás, todos os personagens, dos principais aos secundários, até a antagonista e os que parecem fazer papel de antagonismo, têm uma história complexa, de transformação e capacidade de amadurecimento emocional como se o encontro de Mon e Sam afetasse a todos positivamente. Como se o encontro delas e o amor que elas descobrem sentir uma pela outra fosse capaz de afetar a todos e, por meio do amor, causar uma transformação positiva. As pessoas declaram sentir ciúmes, mas ninguém age intencionalmente com maldade para prejudicar alguém. E até diferentemente do que prega a cultura e a sociedade tailandesa de não ser direto, rude, ofensivo alguns personagens são bastante enfáticos e diretos como se essa característica fosse uma qualidade necessária para que a transformação se efetivasse em todos.

Desse modo, o grande perigo jaz em julgarmos a série com nossos olhos ocidentais. Mas, diante do sucesso de público, creio que esse perigo não exista em larga escala. Estamos tão acostumados a manifestações efusivas e intempestivas de amor ou de ódio que, ao não vermos isso, achamos estranho. Eu achei quase angustiante o excesso de brincadeiras entre Mon e Sam apenas para elas darem um selinho. Mas, depois entendi que se tratava da construção da história delas já que elas não eram lésbicas antes de se conhecerem. No entanto, mesmo assim, estamos no século 21 e mesmo que você seja totalmente ingênuo no assunto do amor e suas intimidades, quase não cola esse excesso de cuidado entre as duas.

De qualquer maneira, creio que outra coisa que as fãs mais adoram é a forma como elas sempre estão se olhando: Mon com um olhar doce, devocional, amoroso, puro. Sam com seu olhar misterioso, perscrutador, intenso e sempre com uma barreira de 500 m de aço para se defender. Confesso que essa intensidade de troca de olhares é algo muito excitante, afinal, os tímidos sabem que precisam recorrer ao silêncio do olhar para avanços milimétricos no ato de conhecer alguém melhor. Hoje em dia não valorizamos muito o olhar, algo que nunca deveríamos deixar de fazer. 

Bem, justamente por estarem se descobrindo lésbicas ao mesmo tempo, e por estarem amando com tanta intensidade pela primeira vez, ambas erram muito em suas inseguranças. É um constante exercício de reflexão, auxílio dos amigos (que ambas tinham separadamente e depois ficou todo mundo no mesmo grupo) e dos pais de Mon. Foram necessárias muitas lágrimas para o amor sempre ser colocado em primeiro lugar. 

Eu, confesso, chorei muito. Muito!!! Mas o último episódio foi o que mais chorei, quando a avó de Sam sai do antagonismo que ocupou na série toda para o destaque principal. Nossa chorei tanto que tive de pausar para deixar as lágrimas saírem e eu me recompor. Chorei ao longo da série, nas brigas entre as duas, no distanciamento ansiando pela volta. Mas o diálogo da avó com Sam me destruiu. Quantos de nós aqui não queremos apenas isso: aceitação? Queremos ser amados pelo que somos, simplesmente. E "o amor vai encontrar um jeito. Ele transcende gênero e sexualidade" disse o sobrinho rico, que tinha chegado da Suíça, para a avó. 

Minha opinião? Sigo o mesmo que disse a moça do canal do YT que citei mais acima: Mon e Sam são um casal que estão na lista dos Top 5 melhores casais lésbicos ficcionais. Não ganha de Bette e Tina (difícil alguém superar esse casal) mas Mon e Sam nos ensinam tanto com seu amor verdadeiro uma pela outra. Obrigada ao autor que escreveu o livro e criou essas personagens e ao Idol Factory que conseguiu tão habilmente transpor esse maravilhoso casal para a tela — não é fácil fazer isso.

Eu me encantei demais com esse "conto de fadas". Alimenta mais um pouquinho aqui meu coraçãozinho cansado e solitário. Gosto de acreditar que possam existir histórias desse tipo por aí como a desse casal cuja matéria li no Uol. E prefiro acreditar que ainda encontrarei a minha história com final feliz, pois, Gap tem um final (cheio dos clichês que mais queremos e amamos) muito, muito perfeito e muito feliz!


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